Páginas

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Jogando RPG Old School

Várias vezes eu já falei sobre a Old School Renaissance (ou OSR para os íntimos), e sobre o estilo old school de jogar RPG, mas na verdade eu nunca falei sobre o que realmente é isso. Eu achei que não era necessário, afinal, o que não falta é lugar explicando o que é o movimento old school no RPG.

E, no entanto, eu ainda vejo em vários locais interpretações errôneas de sobre o que se trata a OSR. Até mesmo gente dizendo que a 4ª edição do D&D é mais próxima do D&D original, (usando a justificativa no foco do jogo nos combates) e não entende porque o pessoal da OSR costuma não gostar dessa edição do jogo.

Então, é melhor eu tentar explicar sobre o que se trata a OSR...

A OSR surgiu de gente que achou que as novas edições do D&D se desviaram muito de seu conceito original, e então decidiram voltar a jogar as versões antigas do jogo. E, ao contrário do que alguns pensam, a OSR surgiu junto com o D&D 3ªed, e não por causa do D&D 4ªed. Claro que há um componente de nostalgia nisso, mas também há o fato de que a maioria das pessoas aprendeu a gostar de jogar D&D por alguma razão, e quando as novas edições do jogo vão diminuindo a importância dessa razão dentro do jogo, essas mesmas pessoas vão gostando menos de jogar. E é provável que a mesma coisa, mas de forma inversa, aconteça com quem aprendeu a gostar do D&D com as edições mais recentes. Para estes, as edições antigas não devem ter a mesma graça.

O que eu quero dizer é que não é simplesmente a lógica do “tudo o que é mais antigo é melhor” (ao menos para os adeptos mais “sérios” da OSR), mas sim porque há um sentido nisso tudo.

Claro que há várias “divergências” dentro da OSR. Há quem pense que só é verdadeiramente old school quem joga OD&D, outros que aceitam até o AD&D 1ªed, e também quem seja menos conservador que isso (como eu). Mas pesquisando um pouco por aí, você descobre que tem gente bem inserida dentro da comunidade da OSR que na verdade não joga nem fala sobre D&D, mas sim de outros jogos, e não raro, jogos estes criados por eles mesmos.

Ou seja, jogar RPG de uma forma old school não tem a ver exatamente com usar este ou aquele sistema, mas sim com o modo de jogar, com o enfoque que se dá ao jogo. Isso não quer dizer também que o sistema não importa. O sistema importa sim, e importa muito. Não que seja impossível, mas dá muito trabalho mudar o enfoque de um jogo quando o sistema força outro aspecto do jogo.

E qual afinal é o principal enfoque de um jogo old school? Os mais afoitos (e menos conhecedores desse estilo de jogo) poderiam dizer “combate”, mas a resposta é outra: exploração. Sim, os jogos mais antigos visavam a exploração do cenário mais do que os combates, ao contrário do que o senso comum leva a crer. É exatamente por isso que se têm as tabelas de encontros aleatórios (porque às vezes nem o mestre sabe o que tem virando a esquina), e que nem todos os encontros são “equilibrados” para o nível dos personagens. O cenário está lá para ser explorado e não para ser “vencido”. E participar de uma exploração significa que às vezes você tem de fugir pra se manter vivo.

Mas então por que as edições antigas do D&D tinham tantas regras para os combates? Simples: porque os combates podem matar os personagens. Ainda que não seja o enfoque principal do jogo, eles podem definir o sucesso ou fracasso da continuidade da exploração, e seria injusto que os resultados do combate fossem determinados inteiramente pelo mestre, por isso todas as regras para torná-lo aleatório.

Outro ponto que demonstra como o combate não é o foco principal é a forma como ele é abstrato. Pontos de vida, ataques genéricos, rodadas longas em termos de tempo de jogo (de 10 segundos a 1 minuto, dependendo da edição), inexistência de aleijões... tudo isso demonstra como em realidade o combate não importa muito no jogo. Combates são divertidos? Claro que são, afinal, são jogos de sorte-e-azar (rolagens de dados aleatórias definem o seu resultado), mas não são o foco do jogo. Por isso que nem todas as habilidades das classes são voltadas para combate. Na verdade, algumas das classes muito pouco tem a fazer em um combate. Ladrões, por exemplo, são quase indispensáveis na exploração, mas tem poucas opções em um combate além de atacar uma vez por rodada, e normalmente com uma arma que causa um dano não muito alto (diferente do striker da 4ªed).

Por isso que, apesar da origem do D&D estar em um wargame, não é o combate o seu foco principal. Até porque, se não fosse assim, nos primórdios do OD&D, se tudo o que se quisesse era rolar combates era mais fácil usar o Chainmail, já que as regras de combate de ambos eram bem similares. O OD&D era pra interpretar personagens e explorar o cenário. E é por isso que o D&D 4ªed não é muito bom pra jogos old school (apesar de não ser impossível), porque o principal foco do sistema é no combate tático, e todos os encontros são pensados de forma a serem equilibrados com o nível dos personagens. Não há muita razão para se explorar um mundo no qual você já sabe de antemão qual será o nível das dificuldades encontradas, então o objetivo passa a ser vencer os desafios e passar de nível.

Obviamente, há muito mais a ser dito sobre a OSR, mas por hora chega. Espero que isso já seja suficiente para desfazer algumas das (muitas) confusões a respeito do estilo old school de se jogar RPG.

8 comentários:

  1. Igor,

    Cara paro aqui para prestar meus sinceros PARABENS por esta materia, esta ai algo que eu gostaria que tivesse sido publicado por mim. Cara você falou tudo que tem para ser dito, de forma clara, objetiva e direta, afinal essa é o metodo Old School de se jogar, nao um sistema mais uma forma de se divertir.

    Parabens mesmo....

    ResponderExcluir
  2. Muito obrigado Goblin!
    Apenas disse o que eu realmente acredito ser a OSR, e o que eu vejo que muitos outros, aqui e na gringa, pensam sobre o assunto.

    ResponderExcluir
  3. Muito bom cara! Já era uma impressão que eu tinha mas você esclareceu muitas coisas. Estou tentando entrar nesse universo do old school, pois vou escrever um cenário para o old dragon. Gostaria de colaborar?

    Ricardo Peraça

    http://livreroleplay.blogspot.com

    ResponderExcluir
  4. Posso ajudar com idéias ou conselhos, mas mais do que isso fica difícil, porque já estou cheio de projetos no momento.

    ResponderExcluir
  5. um otimo exemplo de jogo old school é procurar na net relatos do Robert Kuntz, um dos primeiros jogadores do Gary Gygax , sobre como ele joagva com o Robilar, seu personagem mais famoso.

    Uma coisa q percebo e muitos fazem (inclussive eu mesmo fazia) é "zerar" a dungeon, ou seja, tentar entrar e einvestigar TODAS as salas, independente de qual é o objetivo do jogo.

    Ler sobre os jogos de antigamente e como as primeiras seção ocoriam em Greyhawk são verdadeiras liçoes de historia!

    ResponderExcluir
  6. Bom post.

    Realmente acho que a alma do Old School é a exploração. Além disso, um "charme" desse estilo de jogo é a imprevisibilidade que se esconde nas tabelas de encontros. Jogadores e mestre só ficam sabendo o que vai acontecer na hora do pau.

    Mas não é só de combate que vivem os personagens. Sua menção às habilidades do ladrão foi muito apropriada. Há também habilidades sociais, profissões e ofícios, saber ler e escrever... São essas coisas que fazem os personagens saírem do mundo das estatísticas e passarem para o mundo "real".

    ResponderExcluir
  7. Há coisa mais Old School do que rolar os atributos do personagem? Vi esse post do Greywulf e concordo incondicionalmente. Como ele diz, "Random character generation injects a spark of life into a character, something that’s beyond the control of the player. It’s the voice of Fate saying “Yes, I know you want to play a Magic-User. That’s why I made you roll INT 4. Deal with it.”"

    ResponderExcluir
  8. Fantástica postagem! Cara esse material é muito importante para o artigo que estou fazendo!

    Abraços,

    Druida-filid
    RPGames Brasil
    http;//rpgamesbrasil.blogspot.com

    ResponderExcluir