quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

O Paradigma dos Atributos

Os comentários de uma das minhas postagens anteriores suscitou uma questão na minha mente, e não consegui tirá-la mais da cabeça: O quê levou o paradigma dos atributos no Dungeons & Dragons a mudar?

Sim, porque até a segunda edição do AD&D sempre me pareceu óbvio que os atributos eram o único parâmetro fixo das personagens (além da raça, é claro), pois todo o resto ia se alterando ao longo do jogo, menos eles. Níveis aumentavam, pontos de vida mudavam, pericias eram ganhas, até mesmo de classe era possível mudar. Mas os atributos estavam sempre lá, iguais.

Certo, existiam monstros que drenavam atributos (alguns até permanentemente!) e você ganhava e perdia atributos de acordo com o envelhecimento da personagem. Mas era só isso. Nada de ganhar atributo por “treino”, porque a personagem chegou ao nível “x”.

Sempre pareceu, ao menos para mim, que os atributos mediam o potencial máximo da personagem, diziam quão bom ela seria neste ou naquele campo geral de atuação. Era o que determinava o que a personagem poderia ser e quão bom ela seria naquilo. Eram características inerentes, e não perícias ou conhecimentos que podem ser treinados e melhorados. E sendo inerentes, apenas magia poderia alterá-los.

E de repente, tudo isso mudou. Os atributos básicos das personagens passaram a ser estatísticas mutáveis, que aumentam em um padrão regular, de acordo com a evolução de níveis. Passaram a ser treináveis, passíveis de melhoria natural, mais um dado variável como perícias ou pontos de vida. Ao invés de determinar o que se poderia ser e o quão bom nisso, agora você manipula seus atributos para ser o que você planejar e quanto melhor você for (i.e. quanto mais níveis possuir) melhor você será naquilo que quer fazer (paradoxal, talvez?).

Claro que há influência de outros sistemas de RPG famosos nessa mudança de paradigma, como o GURPS ou o Storyteller, onde os atributos podem ser aumentados com relativa facilidade. Mas por 20 anos o Dungeons & Dragons havia resistido a essa tendência (afinal, atributos que podem ser aumentados não é nenhuma novidade no mundo do RPG), só que a 3ª edição derrubou este paradigma do D&D.

Talvez, seja apenas mais um sintoma da tendência da 3ª edição de tentar fazer com que cada aspecto da personagem possa ser “evoluído” e “melhorado” (chegando ao cúmulo de criar “níveis de raça”). E, depois de jogar o novo sistema, as pessoas começam a enxergar como se isso sempre estivesse (ou devesse estar) ali, como se não ser assim fosse errado (afinal, toda personagem tem o direito de elevar seu atributo a 19 ou 20, onde já se viu!). E tudo isso independente de haver ou não uma explicação plausível de por que essas características podem ser aumentadas.

Como disse o Danielfo, é a mecânica do jogo alterando o próprio cenário, a regra se sobrepondo ao roleplay.

3 comentários:

  1. Faço das minhas, as minhas palavras :))

    Acho que só um jogador que conheça a segunda edição para entender a importância do paradigma dos atributos.

    Todo jogador morria de medo de monstros que drenavam atributos (como a Lâmia), o monstro ficava temível. Sem falar nos efeitos da velhice que eram arrasadores, pois o jogador sentia a perda que uns pontos de força e constituição podia causar.

    Se puder, visita o Pensotopia e lê a minha resenha sobre atributos que acho tem relação com o que vc disse por aqui.

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  2. Que coisa. Hoje li uma passagem do DMG (2nd Ed) que trata exatamente dessa questão de atributos. Achei legal colocar o trecho aqui.

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    Super Characters

    One of the great temptations for players is to create super characters. While this is not true of every player all the time, the desire for power above averything else afflicts most players at one time or another.

    Many players see their characters as nothing more than a collection of numbers that affects game systems. They don't think of their characters as personalities to be developed. Players like this want to "win" the game. These players are missing out on a lot of fun.
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    Taí uma verdade, especialmente quando se trata de 3a e 4a edições: os jogadores vêem seus personagens como uma coleção de números que afetam o sistema. Mas acho que não é culpa dos jogadores, mas uma característica dessas edições, que incentivam a competição por estatísticas. Não é incomum ver no Orkut posts sobre builds e combos.

    De verdade, não tenho nada contra os jogadores ou as edições em questão. Só não acho que esse seja o meu tipo de jogo.

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  3. Outra discussão que esse post suscita é o método escolhido para definir os atributos. 3d6 em ordem? Tem tempo que não vejo isso. Até gostaria de voltar a esse tempo, mas já me acostumei com o 4d6 drop the lowest.

    Hoje tudo é "balanced", "standard array". Parece até pasteurização. Cadê a emoção do inesperado? É aí que temos a chance de colocar a interpretação em jogo.

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